segunda-feira, 28 de setembro de 2009

Conscientização ecológica e o direito ambiental no Brasil

Conscientização ecológica e o direito ambiental no Brasil

Por Marcos Antônio Santos Bandeira

publicado em 02-06-2005

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CONSCIENTIZAÇÃO ECOLÓGICA E O DIREITO AMBIENTAL NO BRASIL.
Marcos Antônio Santos Bandeira[1]

Introdução - Política Pública Ambiental – Conscientização Ecológica – Direito Ambiental no Brasil – Considerações Finais - Bibliografia

Introdução

Verifica-se, ao longo da história, que a humanidade experimentou variadas mudanças nos seus aspectos econômicos, culturais e políticos, todavia, prepondera ainda neste mundo globalizado o modelo do crescimento econômico como fim fundado no domínio tecnológico e controle absoluto sobre os recursos naturais.

O Brasil, país tropical e de dimensão continental, sempre foi reconhecido no cenário internacional como um país privilegiado em face de suas riquezas naturais, mormente em face da diversidade de ecossistemas e da exuberância de suas matas, rios e florestas. A partir de 1500, quando do início da comercialização do pau-brasil para a Europa pela coroa Portuguesa, o Brasil possuía 200 mil km de mata atlântica, entretanto, já no ano de 1900 o pau-brasil foi considerado extinto e até então o Brasil não possuía um código florestal, o que só veio a acontecer com o advento do Decreto nº 23.793/31.

Essa perspectiva histórica se faz necessária para constatarmos que só passamos a nos preocupar com determinado problema quando ele passa a nos afetar ou a nos incomodar de alguma forma. No Brasil, especialmente, a questão ambiental nunca passou de mera curiosidade do homem comum e “descaso” dos poderes públicos, haja vista que num país de gritantes contrastes sócio-econômico, com brutal concentração de renda e desigualdade social, as prioridades das políticas públicas estariam voltadas, em tese, para o combate à miséria, ao desemprego, à inflação e buscando precipuamente o crescimento econômico. Com efeito, não é razoável exigir de um sobrevivente dos “lixões” desses “brasis” que venha a se preocupar com o meio ambiente, pois o seu pensamento está voltado para a satisfação de suas necessidades primárias de sobrevivência. Evidentemente que a conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente, realizada em Estocolmo em 1972, e também a Conferência das nações Unidas sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento, realizada no Rio de Janeiro em 1992, contribuíram para conter esse ilimitado crescimento econômico e construir uma nova consciência de se preservar o meio ambiente, surgindo grupos de ambientalistas em quase todos os países, criando-se organizações não governamentais num contexto em que aos poucos se foi percebendo que os recursos naturais são frágeis e limitados, e que o modelo de desenvolvimento econômico sustentado por uma matriz industrial e tecnológica avançava rapidamente para a degradação dos recursos naturais, com a ameaça ecológica do próprio planeta.


POLÍTICA PÚBLICA AMBIENTAL

A questão relacionada à formulação e implementação de políticas públicas muito tem que ver com a nossa cultura política e social. O discurso de campanha do político que pretende a todo o custo chegar ao poder não guarda coerência com as prioridades colocadas em prática pelo governo. O discurso é efêmero e dura o período necessário para o sujeito chegar ao poder, quando então se perde nos diferentes interesses das alianças, na corrupção e na falta mesmo de compromisso com os interesses maiores da coletividade. Evidentemente que a pauta de políticas públicas que não chegaram a ser implementadas tem uma duração bem maior sobrevivendo a diversos mandatos eletivos. Nesse sentido, Lizt Vieira e Celso Bredariol[2] explicita:

“Política pública é diferente de política de governo porque essa se refere a uma mandato eletivo e aquela pode atravessar diferentes mandatos. É durante a campanha eleitoral que se tem uma primeira definição de prioridades das políticas de governo, ou seja, o eleitor escolhe candidatos de acordo com suas posições quanto às áreas de política pública que deverão ser prioritárias e dentro dessas, quais aspectos deverão ser objetos de maior atenção., recursos, investimentos ou mudanças.”

Num primeiro momento, essas questões de políticas públicas, especificamente no que tange à política ambiental, eram tratadas de forma verticalizada, impostas pelos grupos dominantes nos Estados fortes, caracterizados por grande concentração de poder. Com efeito, no Brasil em que existe a história de governos ditatoriais e de um Poder Executivo forte, essas questões não eram discutidas nos foros naturais, e o Poder Legislativo apenas legitimava a vontade soberana do executivo, o qual, por sua vez, era sustentado pelos interesses das minorias, principalmente dos grandes grupos industriais.

A mudança de paradigma nos modelos de Estado, principalmente a partir do fim da guerra fria e da queda do muro de Berlim e o fim do império soviético, contribuíram para uma melhor organização da denominada sociedade civil, com a participação de outros atores no cenário das discussões das políticas públicas além do próprio Estado, como as ONGS, empresas, Estados membros e municípios, ampliando e aprofundando a discussão do meio ambiente, não se limitando apenas à questão da poluição industrial, mas preocupando-se com o efeito estufa, biodiversidade, produtos geneticamente modificados, eco-desenvolvimento, água, camadas de ozônio e outros temas ecológicos que interessam e afetam a todo o planeta.

Destarte, a reforma do Estado Brasileiro com as imposições inerentes ao modelo neoliberal, visualizado com a abertura do mercado e as privatizações, ensejaram a alteração do conceito de “interesse público”, bem como de que forma ele é construído e quem o define. Os atores sociais passaram a discutir os grandes problemas ambientais no âmbito de uma demanda configurada pelos mais diversos interesses, mas que se resume na confrontação do crescimento econômico e na necessidade de preservar ecologicamente o meio ambiente. Essas demandas, após serem discutidas e colocadas na agenda, precisam ser formuladas por especialistas para depois serem aprovadas no parlamento, a fim de se transformar em políticas públicas a serem implementadas pelo Estado, o qual ainda é o único ator que pode definir com isenção o interesse público, capaz de atender aos anseios de toda a comunidade. Evidentemente que o Estado não se atualizou e o modelo atual, com seus métodos e órgãos de execução precários, são insuficientes para a implementação satisfatória das políticas públicas relativas ao meio ambiente.

Na verdade, a partir da Constituição Federativa do Brasil de 05.10.88 abriu-se a possibilidade de repensar a formulação, tomada de decisão e a implementação das políticas públicas na área do meio ambiente. Com efeito, a referida Carta Magna conferiu competência concorrente aos Municípios, Estados e a União para elaborarem leis ambientais, ensejando o re-direcionamento das discussões, voltando-se para o território do município, ou seja, o espaço de convivência das pessoas que moram numa mesma comunidade e que sentem e percebem as carências na área ambiental, como poluição dos rios, saneamento básico, poluição do ar e sonora, enfim, que passe a pensar que espécie de ambiente desejam para viver e também reservar para as futuras gerações. É de se notar que para esse desiderato é mister que se invista na educação ambiental, inserindo essa matéria nos currículos escolares do ensino fundamental e médio, no sentido de edificar uma grande consciência coletiva que garanta um desenvolvimento sustentável e assegure o princípio constitucional que todos temos de ter direito a um ambiente ecologicamente equilibrado para vivermos com dignidade. Lizt Vieira e Celso Bredariol2 esclarece:

“A gestão ambiental deve se voltar para o território, a bacia hidrográfica, o espaço de convivência, o lugar onde as pessoas moram, promovendo o conhecimento dessas áreas, suas riquezas e carências, suas demandas de equilíbrio, promovendo o encontro e a negociação entre diferentes atores sociais, perguntando ao cidadão: O que é que o senhor deseja? Que desenvolvimento e meio ambiente prefere, para trabalhar e viver, para seus filhos e netos? Que água? Que ar? Que áreas verdes? Que silêncio? Que lazer? Que prazer?

É necessário construir uma cidadania local e planetária, construir pontes entre a melhoria da qualidade de vida no nosso ambiente do dia-a-dia e o enfrentamento das ameaças globais, influir nas decisões da prefeitura ou naquelas dos foros internacionais de negociações...”.

Na verdade, além de se construir essa conscientização em nossa cidade, no cotidiano de nossa comunidade, é imperativo que a sociedade civil se organize e que o Estado, no seu aspecto institucional, ofereça os instrumentos adequados para que o cidadão exerça a sua cidadania e saiba como defender os interesses relacionados ao meio ambiente. É necessário que se crie delegacias e Juizados especializados na área ambiental para dirimir os conflitos verificados nessa área, propiciando o acesso fácil dos indivíduos à justiça. Impõe-se também o dever de chamar à responsabilidade dos gestores públicos, principalmente das médias e grandes cidades, no sentido de sancionar condutas comissivas ou omissivas que causem danos ao meio ambiente, obrigando-os a viabilizar políticas públicas, por exemplo, que assegurem áreas verdes na cidade, despoluição de rios e saneamento básico. A estrutura dos órgãos fiscalizatórios dos Estados, Municípios e União devem trabalhar em harmonia com atribuições definidas, não se olvidando que o Ministério Público, como defensor da sociedade, deve priorizar a defesa intransigente da preservação do meio ambiente, criando curadorias especializadas.

É sabido que essas questões não serão facilmente resolvidas, porquanto há conflitos de interesses nos foros da demanda política. Todavia, a criação dessa conscientização municipal será o grande caminho para a democratização das políticas públicas na área ambiental e conseqüentemente passo determinante para construir a nossa conscientização planetária, capaz de acreditarmos no mundo bem melhor para as futuras gerações.


CONSCIENTIZAÇÃO ECOLÓGICA

O Brasil, embora tenha participado da conferência das Nações Unidas, em Estocolmo, em junho de 1972, quando o mundo começou a sentir a necessidade de preservar os recursos naturais, em face da crescente degradação da qualidade do ar, da água, do solo, da flora e da fauna, provocada pelo desenfreado crescimento econômico alimentado pelo processo de industrialização, preferiu, no âmbito de um governo ditatorial, o crescimento econômico a qualquer custo – “milagre Brasileiro” em detrimento da preservação do meio ambiente, ensejando assim a implementação de grandes projetos nacionais, como a construção da transamazônica, Usina hidrelética de Tucuruí e expansão do projeto Carajás na década de 1970 e que consistia na exploração de 900 km de ferrovia entre Pará e Maranhão, os quais foram executados sem qualquer avaliação do impacto ambiental, ocasionando, por conseguinte, graves problemas ambientais e a devastação de vários ecossistemas com prejuízos irreparáveis para o equilíbrio ecológico[3].

Na verdade, a conferência de Estocolmo serviu para erigir uma conscientização internacional quanto à necessidade de se preservar o meio ambiente, permitindo a diversos países a criação de instrumentos normativos para proteger e introduzir nas suas agendas públicas a política ambiental, despertando o surgimento de grupos ambientalistas que passaram a se organizar através de ONG – organização não governamentais – e a pressionar o Estado em busca de um desenvolvimento sustentado que evitasse a degradação generalizada do meio ambiente.


DIREITO AMBIENTAL NO BRASIL

No âmbito jurídico surgiram diplomas esparsos – código de pesca, código florestal, responsabilidade por atividades nucleares, etc – disciplinando timidamente atividades específicas, todavia, sem qualquer sistematização e efetividade, em razão do desconhecimento da maioria dessa lei e da ausência de qualquer estrutura jurídica e fiscalizatória que pudesse impor à sua aplicação imperativa, tornando-se assim “lei morta”, no âmbito de um processo ordinário demasiadamente lento e inefetivo, absolutamente insuficiente para proteger o meio ambiente[4].

Na verdade somente com o advento da lei 7.347, de 24.07.85, que instituiu a ação civil pública, é que foi disponibilizado pela ordem jurídica um instrumento extraordinário , cujo objetivo precípuo era tutelar os bens e interesses de valor artístico, estético, histórico, paisagístico e turístico, todavia, esta ação a despeito de possuir um rito célere, inclusive com a possibilidade da concessão liminar do pedido, vem sendo utilizada basicamente pelo Ministério Público, já que os demais legitimados – associações, ongs, etc, vêm utilizando muito pouco desse poderoso instrumento. A lei nº 6.938, de 31.9.1981 consolidou a Política Nacional do Meio Ambiente, inserindo a responsabilidade objetiva do poluidor e imprimindo ainda uma concepção acautelatória e de reparação de danos. Nesse diapasão, é criado em 1984 o Conselho Nacional do Meio Ambiente – CONAMA – que estabelece diretrizes para a educação ambiental, valendo ressaltar que em 1987 o Conselho Federal de Educação aprovou proposta para a inclusão ambiental nos currículos escolares de 1º e 2º graus.

A Constituição Federal, de 05.10.1988, inaugura uma nova era do meio ambiente, dando-lhe status constitucional ao estabelecer no seu art. 225 que “ todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado”, erigindo assim uma estrutura tutelar e efetiva do meio ambiente. Destarte, a ordem jurídica que até então cuidava da problemática do meio ambiente como algo setorizado, visualizada no prisma meramente individualista, passa a tratar o meio ambiente de forma macrossocial, como interesse difuso e coletivo. Na seara legislativa inovou-se ao atribuir à União, aos Estados e ao Distrito Federal competência concorrente para legislar sobre proteção ao meio ambiente. O art. 5º, LXXIII da CF conferiu a qualquer cidadão – eleitor – o direito subjetivo público de propor ação popular com a finalidade de anular ato lesivo ao meio ambiente praticado pela União Federal, Distrito Federal, Estados e Municípios, entidades autárquicas, sociedades de economia mista, empresas públicas e quaisquer outras entidades que recebam subvenções dos cofres públicos. Também foi criado o Mandado de Injunção, a propósito muito pouco utilizado, pelo qual o Ministério Público, entidades ou mesmo pessoas físicas poderão acionar o órgão encarregado de fazer algum serviço público ligado ao meio ambiente e que em face de omissão legislativa esteja inviabilizando direitos subjetivos ambientais.

A criação do IBAMA em 1989, como entidade encarregada de formular, coordenar e executar a política nacional do meio ambiente, sem dúvida, representou um marco histórico, todavia, o grande acontecimento, considerado um dos mais importantes encontros internacionais já realizado no mundo, foi a conferência Rio 92, realizada no Rio de Janeiro e que reuniu mais de 170 países, cujo objetivo principal foi promover o desenvolvimento sustentado e aperfeiçoar a legislação ambiental no âmbito internacional, além de discutir relevantes assuntos ligados à área ambiental. Esse acontecimento – ECO 92 – serviu para aumentar nossa consciência ecológica e resultou em avanços na área do direito ambiental, principalmente com a edição da lei nº 9.605/98, que sistematizou os crimes ambientais adequando-se a moderna corrente do direito penal da intervenção mínima e voltada marcadamente para uma justiça consensualizada. O Novo diploma legal além de prever sanções administrativas, estabelece sanções penais para tipos penais, cuja conduta e resultado são lesivos ao meio ambiente. A grande inovação foi prever a responsabilidade penal das pessoas jurídicas, atendendo às exigências do mundo globalizado, que a exemplo do que já ocorrera na área cível , a reconheceu como ente jurídico que deve cumprir o seu papel social – “dever ser” - e ser objeto de regulação, mesmo em se tratando de uma ficção de pessoa que se atribui personalidade jurídica, podendo, portanto, cometer ato lesivo de relevância penal. Nesse sentido é lapidar a lição extraída do acórdão MS _ 4849 – TRF – 4ª região – Rel. Juiz José Luiz B. Germano da Silva:

“ A vontade da pessoa jurídica, portanto, teve de ser reconhecida, consubstanciando-se no seu cérebro que é a pessoa física gerenciadora das atividades sociais...quando o colegiado que dirije a pessoa jurídica decide poluir um rio, despejando os dejetos, porque dispendioso seria agir de outro modo; ou , por outro lado, opta por uma solução de previsível insuficiência para evitar o dano, ocasionando-o, evidentemente não se está ante uma ação individual, mas na presença de uma atividade da própria sociedade, do empreendimento e, logo, este há de responder pelo crime tipificado. A autoria da pessoa jurídica deriva da capacidade jurídica de ter causado um resultado voluntariamente e com desacato ao papel social imposto pelo sistema normativo vigente. Esta é a ação penalmente relevante.”

Como se depreende a lei nº 9.605/98, além de prever sanções penais, também estabeleceu sanções administrativas e civis, inclusive buscando a efetividade do processo previu a “desconsideração da pessoa jurídica”, toda vez que esta constituir obstáculo ao ressarcimento dos prejuízos causados ao meio ambiente. É de se ver, entretanto, que por força do “loby” dos evangélicos , lamentavelmente, foi vetado o dispositivo legal que previa o crime de “poluição sonora” , fenômeno que hoje inferniza a vida de muitas pessoas, as quais se acham impotentes por não dispor de um instrumento jurídico eficaz para conter esses abusos. A referida lei tem manifesta conexidade com a lei nº 9.099/95 – que instituiu os juizados especiais criminais – bem como com a Lei nº 10.259/01 – criadora dos Juizados Especiais Federais - , que ampliou o rol dos crimes de menor potencial ofensivo, derrogando o art. 61 da Lei 9.099/95, ao considerar delitos de menor potencial ofensivo aqueles aos quais a lei comine pena privativa de liberdade não superior a 2 anos. Nesse sentido, a Lei nº 9.605/98 previu 38 figuras típicas consideradas de menor potencial ofensivo, tendo em vista que cominam penas de até 2 anos, cabendo, portanto, institutos despenalizadores, como v.g., a suspensão condicional do processo e a transação penal, todavia, tanto num caso quanto no outro é “conditio sine qua non” a comprovação da reparação do dano ambiental. Na verdade alguns delitos comportam a suspensão condicional do processo, já que a pena mínima é igual ou inferior a um ano. Evidentemente que a pessoa jurídica como responsável penal estará sujeita a penas alternativas como “prestação de serviços à comunidade ou a entidade pública”, prestação pecuniária, perda de bens, interdição de direito e multa, dentre outras pertinentes. O único delito que não comporta a transação penal ou a suspensão condicional do processo é o previsto no art. 41 da referida lei – “ incêndio doloso em mata ou floresta” , cuja pena de reclusão varia de dois a quatro anos, admitindo-se, entretanto, a aplicação de penas alternativas .

Como se depreende, andou bem o legislador ao impedir que o infrator desses crimes seja condenado necessariamente à pena privativa de liberdade, pois no atual estágio de um Estado Social e Democrático de Direito é curial que se tutele bens juridicamente relevantes, afastando-se do direito penal clássico centrado na prisão, e voltando-se o seu foco para estimular o senso de responsabilidade do infrator, dando-se fundamento pedagógico à sanção aplicada a determinada conduta típica, no sentido de criar instrumentos inibitórios e evitar o cometimento de outros delitos semelhantes – prevenção especial – bem como desencorajando-se os demais membros da comunidade de violar preceitos primários dos crimes contra o meio ambiente – prevenção geral - , principalmente, em relação às pessoas jurídicas contras quais as sanções de natureza econômica devem funcionar de forma eficaz. Com efeito, entendo que o legislador ao não estabelecer a privação da liberdade como finalidade teleologica das sanções impostas aos infratores desses crimes buscou construir uma sólida consciência ecológica e o senso de responsabilidade social, sendo certo que a prisão , na esteira do direito penal mínimo, deve ser reservada para os crimes hediondos de grande potencial ofensivo, ou seja, àqueles praticados com violência ou grave ameaça, funcionando assim como a “ultima ratio”. Na verdade a autoridade judiciária deve buscar uma interpretação que compatibilize princípios assecuratórios de um desenvolvimento sustentável[5] e que, de fato, tutele essencialmente o meio ambiente.

É curial, antes de mais nada, que além de erigir uma conscientização ecológica, passemos a nos preocupar inicialmente com o nosso Bairro, nossa cidade e o cotidiano de nossa comunidade, como forma de adotarmos uma postura preventiva e pedagógica em relação ao meio ambiente, começando, v.g., por não jogar lixo na rua e não permitir a poluição de nosso rios. Os estudiosos em questão ambiental, Lizt Vieikra e Celso Bredariol2 discorrendo sobre a gestão ambiental explicitam:

“ A gestão ambiental deve se voltar para o território, a bacia hidrográfica, o espaço de convivência, o lugar onde as pessoas moram, promovendo o conhecimento dessas áreas , suas riquezas e carências, suas demandas de equilíbrio, promovendo o encontro e a negociação entre diferentes atores sociais, perguntando ao cidadão: o que é que o senhor deseja? Que desenvolvimento e meio ambiente prefere para trabalhar e viver, para seus filhos e netos? Que água? Que ar? Que área verdes? Que silêncio? Que lazer? Que prazer?

É necessário construir uma cidadania local e planetária, construir pontes entre a melhoria da qualidade de vida no nosso ambiente do dia-a-dia e o enfrentamento das ameaças globais, influir nas decisões de prefeituras ou naquelas dos foros internacionais de negociações”.

Voltando-se essas premissas para a situação regional e sentindo assim de perto o problema que de alguma forma nos afeta diretamente no cotidiano, é imperativo que o foco de nossa atenção volte para as questões relacionadas ao meio ambiente da região cacaueira, evitando assim, que continuemos indiferentes aos lixões descarregados nos mananciais do “cururupe” em Ilhéus, à ocupação predatória dos nos manguezais de Ilhéus, à destruição dos manguezais de Canavieiras e Belmonte e Nova Viçosa, à poluição do Rio Cachoeira em Itabuna e a poluição sonora nas cidades de Ilhéus e Itabuna.Também não podemos esquecer a depredação de nossa rica memória histórica, esquecida nas páginas amareladas de Jorge amado e Adonias Filho e tantas outras personalidades que transformaram a nossa dura realidade em história.


CONSIDERAÇÕES FINAIS

Como se depreende, não há como negar os avanços consideráveis ocorridos na seara da preservação do meio ambiente em nosso país, todavia, precisamos avançar ainda mais e consolidar uma consciência ecológica, especialmente, no espaço onde vivemos, conhecendo os focos de degradação ambiental e os instrumentos jurídicos disponíveis na ordem jurídica ambiental, no sentido de exigirmos das autoridades competentes o cumprimento da legislação ambiental, bem como de propiciar ao cidadão e as entidades ambientalistas a condição de participar da discussão ambiental e das políticas públicas, aliás como já acontece com as audiências públicas realizadas em algumas localidades, contribuindo assim para edificarmos um mundo melhor para todos nós.

Entendemos que o caminho natural é especializar o profissional do direito ambiental, seja ele juiz, promotor, procurador ou advogado, no sentido de que possa intervir de forma qualificada nas questões ambientais, partindo-se do pressuposto de que conhecendo a realidade ambiental em todas as suas variáveis saberá encontrar a solução adequada para cada caso concreto. Destarte, sugerimos que seja criado, a exemplo do que já ocorre com os Juizados de Defesa do Consumidor, o microssistema dos Juizados Especiais dos Crime Ambientais, como Juízo diferenciado e de fácil acesso a cidadãos e demais entidades legitimadas , a fim de que possa se constituir no guardião do direito sagrado das futuras gerações de usufruírem de um meio ambiente sadio e equilibrado.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:

LIZT VIEIKRA E CELSO BREDARIOL. CIDADANIA E POLÍTICA AMBIENTAL. RIO DE JANEIRO: RECORD, 1998;

Le Prestre, P. Ecopolítica Internacional. São Paulo: Editora Senai, 2000;

Revista de estudos ambientais, Blumenau, v.1, nº 2, 71-88, maio/ago 1999 – Agripa Faria, Alexandre – A desligitimidade da problemática sócio-ambiental.

Monografia (A participação da Justiça na Implementação de Projetos ambientais do Terceiro Setor – Christine Fonseca Arães, UESC, Ilhéus, 2002.

Acórdão do TRF – 4ª Região.

Moraes, Luis Carlos Silva de. Curso de Direito Ambiental. São Paulo: Atlas, 2002.

Revista de estudos ambientais, Blumenau, v2, nº 2-3, 5-20, mai/dez 2000 ( A questão ambiental brasileira, Carlos Saldanha Machado).

[6]
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[2] LIZT VIEIKRA E CELSO BREDARIOL. CIDADANIA E POLÍTICA AMBIENTAL. RIO DE JANEIRO: RECORD, 1998;

[3] “Dos ecossistemas naturais brasileiros, um dos mais ameaçados é a mata atlântica, pois da cobertura vegetal original só restam aproximadamente 8% (Fundação SOS mata atlântica, 1996). Aliado a isso, é uma área onde se verifica a ocorrência de muitas espécies animais e vegetais não encontradas em outros ecossistemas no mundo (endemismo).

Por esse motivo, a Conservation Internacional, ONG ambiental norte americana, classificou a mata atlântica, dentre outros 25 ecossistemas no mundo, como um hotspot, ou seja, área com alto grau de endemismo e risco de extinção das espécie.

No Brasil, os remanescentes consideráveis da Mata Atlântica estão situados em grande parte da região sul do Estado da Bahia, onde pesquisadores encontraram área em que existem mais de 400 espécies vegetais por hectare”.

[4] “ Até o início da década de 1980, a legislação brasileira não contemplava a questão ambiental. Havia um conjunto de leis vagas e dispersas, estabelecidas em diversos níveis jurídico-administrativos(3), que regulavam atividades específicas, mas não tinham um caráter ambiental, pois haviam sido concebidas e eram implementadas no contexto de um modelo de desenvolvimento e de um arcabouço legal que desconhecia a questão ambiental nos termos em que ela se apresentará a partir dos anos 1970”.

[5]“Como vimos , o sistema jurídico deverá ser direcionado a garantir “os processos ecológicos essenciais..” e, instituir leis para vedar “as práticas que coloquem em risco sua função ecológica, provoquem a extinção de espécies ou submetam os animais a crueldade..’, ou seja, a finalidade da legislação ordinária é o essencial, com a proteção do ecossistema; as espécies integrantes deste também, mas de forma indireta, como meio de atingir um monitoramente satisfatório daquele.

A leitura da CF acena com sanções penais e administrativas, ao mesmo tempo que considera realmente preocupante a lesão a processo essenciais, risco de extinção de espécies e crueldade.

Desdobrando: quando formos verificar se o objeto jurídico foi lesionado, mais do que o animal, a planta, o rio etc.., especificamente , há de ser monitorar todo o ecossistema em que o objeto material se inclui, para verificar também os processos essenciais foram afetados, se há risco de extinção da espécie. Desse exame é que retiramos a constatação de lesão e sua gravidade”.


1 Marcos Antonio Santos Bandeira é Juiz de Direito da Vara do Júri, imprensa, execuções penais, Infância e Juventude da Comarca de Itabuna; especialista em direito processual civil e professor de Direito Processual Penal do Curso de Direito do CESESB.

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