quarta-feira, 11 de abril de 2012

SENTENÇA INTERNAÇÃO

PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DA BAHIA
COMARCA DE ITABUNA
JUÍZO DE DIREITO DA VARA DA INFÂNCIA E DA JUVENTUDE

AÇÃO: PROCESSO DE APURAÇÃO DE ATO INFRACIONAL Nº. 0000000-00.0000.000.0000
AUTOR: MINISTÉRIO PÚBLICO
REPRESENTADO: TÍCIO SANTOS e OUTRO
VÍTIMA: ASTOFO ANDRADE


SENTENÇA


O MINISTÉRIO PÚBLICO ESTADUAL, por intermédio de seu ilustre representante, titular da Vara da Infância e Juventude desta Comarca, ofereceu REPRESENTAÇÃO contra os adolescentes TÍCIO SANTOS e ASTOFO ANDRADE, devidamente qualificados nos autos, porque teriam, no dia 12 de setembro de 2010, por volta das 23h30min, próximo ao Hospital “X”, nesta Cidade, em comunhão de desígnios e ações previamente ajustadas, subtraído para si, mediante grave ameaça exercida com arma de fogo, uma moto Honda/fan 000 pertencente a Josué Ferreira, subsumindo assim à sua conduta ao tipo similar descrito no art. 157, § 2º, I e II do Código Penal Brasileiro. Narra a peça incoativa, que a vítima, no dia e hora acima mencionados, encontrava-se com sua moto estacionada nas proximidades do Hospital “X”, com o capacete no guidom, quando chegaram os representados em uma Honda 000, de cor verde, surpreendendo a vítima, sendo que o carona apontou a arma para a vítima e mandou que a mesma entregasse a chave. Consta ainda da exordial, que o representado Tício, após diligências policiais, foi apreendido no Bairro “G”, próximo da Granja “C”, pilotando a moto, objeto do roubo. Também foi encontrado com o representado um aparelho celular, de cor preta, marca mini. O representado Tício confessou a prática do assalto e também indicou o endereço do representado Astofo, entretanto, este conseguiu fugir do cerco policial e atualmente encontra-se em lugar incerto e não sabido.
Consta dos autos que o representado Tício já responde nesta Comarca pela prática de outros atos infracionais – Proc. Nº. 00000000000000, 00000000000000 e 00000000000000.
A Representação veio acompanhada do respectivo auto de apreensão e foi recebida no dia 29 de outubro de 2010. Realizada audiência de apresentação procedeu-se o interrogatório do representado e colheu-se as declarações de sua genitora (fls.00/00). Também, em plena audiência de apresentação, foi decretado o internamento provisório do representado Tício, conforme decisão fundamentada e constante das fls.00. O processo prosseguiu somente com relação ao representado Tício Santos, já que o outro representado, Astofo Andrade encontra-se foragido.
O ilustre defensor do representado Tício Santos, dentro do tríduo legal, ofereceu DEFESA PRÉVIA, sustentando que a “denúncia” carece de veracidade, mas reservando-se para adentrar no mérito por ocasião da prolação da sentença. Também foram arroladas três testemunhas.
Realizada a instrução colheram-se os depoimentos das testemunhas Murilo de Jesus e Otávio Cerqueira, arroladas pelo Ministério Público. Também foram inquiridas as testemunhas Maria Silva, Bruno Oliveira e Diego Souza, arroladas pela defesa, valendo ressaltar que a defesa requereu em audiência a substituição da testemunha Carlos Tácito pela testemunha Bruno Oliveira, sendo o pedido deferido por este Juízo. A defesa insistiu na oitiva da vítima, dispensada previamente pelo Ministério Público, todavia este Juízo indeferiu o pedido porquanto não fora arrolada pela defesa e as provas já produzidas nos autos tornavam desnecessária a oitiva do ofendido.
Ultimada a instrução do processo socioeducativo, o ilustre representante do parquet, com apoio nas provas produzidas nos autos, pugnou pela procedência da representação e aplicação da medida socioeducativa de internamento, porquanto restou comprovado nos autos a autoria e materialidade do ato infracional na pessoa do representado Tício e terceira pessoa, cuja conduta se amolda ao tipo descrito como roubo qualificado pelo concurso de agentes e por ameaça exercida com emprego de arma de fogo – art. 157, § 2º, I e II do CPB. Aduz ainda que o representado vem reiterando na prática de atos infracionais, pois está sendo acusado de ter praticado atos infracionais nos dias 30/09/2008, 15/02/2010 e 03/08/2010, valendo ressaltar que esta última se deu na cidade “J”, e o representado Tício também foi apreendido pela prática de assalto naquela cidade.
O ilustre defensor, por sua vez, em sede de alegações finais, afirmou que não foi observado por ocasião do inquérito policial o que preceitua o art. 306 do CPP, já que a comunicação ao juiz da prisão do representado ocorreu 03 (três dias) após, quando deveria ser no prazo de 24 horas, acentuando que a prisão do representado é manifestamente ilegal. Aduz que nos crimes que deixa vestígios não foi realizado o exame de corpo de delito, assinalando que a qualificadora da arma de fogo merece ser descartada. Argumenta que o Promotor de Justiça fere de morte o princípio da presunção da inocência ao tecer ilações acerca de outros inquéritos policiais para fundamentar a reincidência, uma vez que em nenhum dos inquéritos/processos mencionados pelo Promotor houvw o trânsito em julgado. Aduz no mérito que o representado Tício, com apoio nos depoimentos dos policiais, colaborou com as investigações e a resolução do fato, tendo, inclusive, conduzido os policiais até o local onde Astofo se encontrava, merecendo, portanto, o benefício da redução da pena a ser imposta, de um a dois terços. Alega ainda, em sede de “meritum causae”, que a participação do representado no evento foi diminuta, já que foi o outro representado quem utilizou a arma de fogo. Finalmente, enaltece as qualidades pessoais do representado Tício, com base nos depoimentos prestados pelas testemunhas arroladas pela defesa, ressaltando a sua excelente conduta social. Requer ainda a aplicação da remissão conforme previsão do art. 188 do ECA, todavia, caso assim não entenda, que seja aplicado o disposto no art. 189, inc. IV do ECA, por não haver provas de ter o representado concorrido para a infração penal, “salvo na participação diminuta se for levado em consideração”. Vieram-me os autos conclusos.
É O RELATÓRIO.
DA FUNDAMENTAÇÃO E DECISÃO.
Impõe-se apreciar a “prima facie” algumas questões formais suscitadas nos autos, para depois então, se for o caso, adentrarmos na apreciação meritória do fato deduzido em Juízo.
O ECA – Estatuto da Criança e do Adolescente – não se confunde com o Direito Penal, pois trata-se de um microssistema jurídico, que tem autonomia científica, possuindo metodologia e princípios próprios. O representado, ou seja, o adolescente menor de 18 anos de idade está fora do sistema penal, e por consequência, não sofre pena pela prática de atos infracionais, mas medida socioeducativa, que tem um conteúdo preponderantemente pedagógico, pois está voltado para reverter os fatores criminógenos e introjetar valores com relação ao sujeito que se encontra na peculiar condição de desenvolvimento. Logo, a despeito de se utilizar de garantias materiais e processuais, o processo de apuração de ato infracional não é o mesmo destinado aos imputáveis, mas algo novo, que possui disciplinamento e procedimento próprios. Nesse sentido é lapidar a lição de Paulo Afonso Garrido de Paula em seu excelente artigo intitulado “Ato Infracional e natureza do sistema de responsabilização”, senão vejamos: “O direito da Criança e do Adolescente foi buscar no garantismo penal, concepção indicativa do conjunto das garantias materiais e processuais que limitam a intervenção do Estado na esfera de liberdade do indivíduo e que projetam uma intervenção estatal estritamente regrada, inspiração para o estabelecimento de seus pilares que, juntados a outros, especiais, determinaram a criação de algo novo. Isto não o transforma em Direito Penal, vez que suas bases são diversas, seus postulados são distintos, sua esfera de incidência outra. Apenas indica que também objetivou um sistema limitador da arbitrariedade do Estado e de respeito às liberdades individuais que, temperado pelos seus escopos próprios, redundou em algo que não se confunde com o Direito Penal, mesmo porque, caracterizado este pela incidência de penas, confrontar-se-ia com a garantia de que menores de dezoito anos de idade são inimputáveis, ficando sujeitos a normas residentes em diploma especial (CF, art. 228)”.
A ação socioeducativa contra adolescente a quem se atribui a prática de ato infracional e que se inicia através de representação de titularidade exclusiva do Ministério Público tem procedimento próprio e que se encontra disciplinado nos arts. 186 e seguintes do ECA. Corroborado esta assertiva, o 1º Fórum Nacional de Juízes da Infância e Juventude do Brasil realizado em Goiânia, aprovou o seguinte enunciado: “reafirma-se que o ECA é lei especial não tendo sido alterado pela Lei nº 11.719 (reforma do CPP)”.
Ressalte-se que, por força do disposto no art. 152 do ECA, aos procedimentos regulados nesta lei (ECA), aplicar-se-á subsidiariamente as normas processuais cíveis e criminais e desde que não contravenham aos preceitos estatutários.
A primeira questão a ser enfrentada e que foi suscitada na audiência de instrução e julgamento pelo defensor do representado é a sua insistência com relação à ouvida do ofendido, que fora arrolada exclusivamente pelo Ministério Público, que entendeu desnecessária à sua oitiva, requerendo assim, a sua dispensa. Ora, todas as testemunhas arroladas pela defesa foram ouvidas e nenhuma presenciou o fato imputado ao representado. Logo, se era interesse dos defensores em ouvir a vítima deveriam assim arrolá-la em sua defesa prévia, o que incorreu. Evidentemente, que o juiz, caso julgasse ser uma prova importante e imprescindível para o desate da questão, poderia ouví-la, dentro do princípio da busca da verdade processualmente possível. Todavia, o arcabouço probatório constante dos autos já esclareceu à saciedade toda a dinâmica do ato infracional atribuído ao representado, não havendo, portanto, necessidade de se produzir qualquer prova nesse sentido, principalmente em face da confissão do representado e a ressonância das demais provas produzidas nos autos. Destarte, a norma insculpida no §4º do art. 186 do ECA é de clareza solar ao estabelecer que “na audiência em continuação, ouvidas as testemunhas arroladas na representação e na defesa prévia”, passará no mesmo ato à fase das alegações finais e em seguida o juiz prolatará a sentença, dando assim a ideia de que a audiência de instrução e julgamento é una e concentrada, devendo todas as provas serem produzidas nesta audiência, ressalvadas algumas exceções, o que não é o caso dos autos. Na verdade, com a devida vênia, o objetivo nítido do defensor era postergar o procedimento e assim extrapolar o prazo de 45 (quarenta e cinco) dias para a conclusão do procedimento, dando azo para justificar o desinternamento do representado Tício. Desta forma, entendo desnecessária a ouvida do ofendido e ratifico o posicionamento anterior de indeferir o pedido de oitiva da vítima formulado pelo defensor do representado. Indagar-se-á: O que a vítima poderia acrescentar em Juízo, além daquilo que depusera na polícia? Mudaria a essência do ato infracional ou o seu iter criminis, já confessado tanto na fase policial quanto na fase judicial pelo representado e corroborado pelas provas orais colhidas em Juízo? A declaração da vítima teria o condão de revelar que o evento delituoso foi praticado sem grave ameaça, quando já ficou devidamente esclarecido que o representado Tício pilotava a moto, enquanto seu comparsa apontava a arma para a vítima? Claro, que diante das provas já produzidas, torna-se desnecessária a oitiva da vítima, razão pela qual, este Juízo, como sujeito imparcial e equidistante às partes e interessado no resultado justo do processo entendeu dispensável a declaração da vítima. Ora, como se sabe, o ECA adotou com relação às nulidades o sistema da instrumentalidade das formas, no âmbito da doutrina francesa “pás nullité sans grief”, no sentido de que qualquer nulidade de ato processual só será declarada caso haja demonstração de efetivo prejuízo para a parte prejudicada, o que à evidência não é o caso dos autos.
A eventual alegação de que a apreensão do representado estava ilegal, em face de não ter sido comunicada a prisão ao juiz no prazo estatuído no art. 306 do CPP não procede e está superada. Ad primam porquanto o referido dispositivo e seus parágrafos não se aplicam subsidiariamente ao ECA, pois este já dispõe de disciplinamento próprio constante do art. 107, que reza o seguinte, “in verbis”:
Art. 107. A apreensão de qualquer adolescente e o local onde se encontra recolhido serão incontinenti comunicados à autoridade judiciária competente e à família do apreendido ou a pessoa por ele indicada.
Transportando-se essas premissas para a hipótese vertente, vê-se que o adolescente foi apreendido às 23h30min do dia 22/10/2010 – uma sexta-feira -, portanto, praticamente na madrugada do dia 23/10/2010 – sábado. O dia seguinte – 24/10/2010 – não teve expediente forense e a segunda-feira – dia 25/10 – também não houve expediente. Logo, o primeiro dia útil, de fato, foi o dia 26/10/2010, quando a Vara da Infância e Juventude foi comunicada da apreensão do adolescente. A inobservância desta comunicação não acarreta necessariamente a ilegalidade da prisão, como acontece na seara processual penal, mas responsabilidade para a autoridade policial, como se depreende pela leitura do disposto no art. 231 do ECA, o que inocorreu na espécie. Na verdade, mesmo que tivesse ocorrido alguma irregularidade, o Ministério Público ofereceu a Representação no dia 26/10 e este Juízo realizou a audiência de apresentação e decretou o internamento provisório do representado no dia 28/10/2010, portanto, dentro do prazo de cinco dias da apreensão do representado, não havendo espaço para arguir qualquer retardo na entrega da prestação jurisdicional, razão pela qual, afasto a suposta irregularidade apontada pelo ilustre defensor do representado.
MERITUM CAUSAE
Depreende-se pela leitura dos elementos probatórios constantes dos autos, que são incontroversos a autoria e a materialidade do ato infracional. Com efeito, a materialidade está comprovada pelo Auto de Exibição e apreensão de fls. 00, o qual testifica a apreensão da res furtiva – uma motocicleta Honda/CG fan, cor preta, ano 2008, placa policial XXX-0000, em poder do representado Tício Santos. A autoria do ato infracional está evidenciada nos autos pela própria confissão do representado Tício, senão vejamos: “que no caminho Astofo viu uma moto e gostou da moto;que Astofo então o chamou para fazer um assalto; que concordou e foi com Astofo;que quem estava armado era Astofo; que estava pilotando a moto e Astofo estava na carona com a arma; que Astofo desceu da moto e anunciou o assalto; que nesse momento pegou a moto roubada e saiu pilotando e Astofo saiu na moto (sic) que já era dele mesmo...que os policiais já sabiam que haviam roubado uma moto e o reconheceu pela roupa que estava usando; que os policiais saíram atrás e quando viu saiu correndo”.
A confissão do representado que também foi feita na fase policial é corroborada pelas demais provas coligidas nos autos, mormente os depoimentos das testemunhas que depuseram em Juízo:
Depoimento de Murilo de Jesus - fls.00.
“que estava em ronda no bairro “Z” quando a central passou uma informação que havia ocorrido um assalto próximo as imediações da padaria “X”; que a central passou também a placa da moto que havia sido furtada; que teve também informação das características através da vítima; que ao passar na Av. “Y” viu a moto e conferiu a placa...que ao perceber a viatura o representado empreendeu fuga, e acelerou a moto; que saiu em perseguição e no bairro “G” o representado caiu no matagal; que neste momento deu voz de prisão ao representado”.
Aferidos a autoria e a prova da materialidade do ato infracional, vê-se que o ato foi praticado mediante grave ameaça exercida com emprego de arma de fogo. O próprio representado afirma que o outro representado foi quem estava apontando a arma para a vítima e exigindo que ela lhe entregasse as chaves da moto, enquanto ele pilotava a moto. Com efeito, o ato se amolda ao disposto no art. 122, I do ECA, a exigir a medida extrema do internamento. Trata-se de um ato infracional correspondente ao tipo descrito no art. 157, §2º, I e II do CPB, pois além do emprego de arma de fogo o ato foi praticado com o concurso de duas pessoas, o que potencializa o desvalor do ato perpetrado pelo representado Tício e terceira pessoa, em face de tornar impossível a defesa da vítima.
A questão levantada pelo defensor do representado de que seria necessário proceder a perícia da arma de fogo utilizada para afastar a qualificadora do emprego de arma de fogo, data vênia, não tem qualquer amparo legal na seara do ECA. Se o questionamento vale para o sistema penal, muito embora o STF recentemente tem entendido desnecessária a perícia para aferir a potencialidade lesiva da arma nos crimes de porte e roubo qualificado, no sistema socioeducativo não tem aplicação, porquanto o ECA não descreve o tipo e suas qualificadoras como acontece no Código penal. Na verdade, a luz do ECA, basta que o ato infracional tenha sido praticado com violência ou grave ameaça , conforme preceitua o art. 122, I do ECA. Logo, a grave ameaça pode ser comprovada pelos depoimentos das testemunhas, confissão do representado, sem necessidade de proceder a perícia na arma, o que vale afirmar que o representado poderia ate ter utilizado arma de brinquedo, desde que ela tenha sido idônea para intimidar a vitima, minando a sua resistência e ainda assim caracterizaria a elementar “grave ameaça”. Se existisse necessariamente a realização de perícia da arma de fogo para configurar a elementar “grave ameaça”, seria impossível condenar algum meliante por roubo, toda vez que a arma não fosse encontrada. Todo meliante seria estimulado a jogar fora a arma de fogo para fugir de uma sentença condenatória, o que seria um absurdo. Logo, não resiste ao mais tênue exame a alegação feita pelo ilustre defensor sustentando a necessidade da perícia da arma de fogo para afastar a qualificadora no âmbito do ECA, fato que me levara a desconsiderar a imprecação por ser destituída de qualquer fundamento jurídico.
O ilustre defensor, datíssima vênia, mais uma vez incorre em impropriedade terminológica, quando discorrendo sobre o principio da presunção da inocência alega que “ O doutor promotor tanto na acusação quanto nas alegações finais viola de morte” o preceito constitucional acima informado ao tecer ilações acerca de outros inquéritos policiais para fundamentar a reincidência uma vez que em nenhum dos inquéritos/processos mencionados pelo promotor possuem transito em julgado, e adolescente a quem se atribui a pratica de atos infracionais não tem antecedentes criminais, pois ele não comete crime e não esta sujeito ao sistema penal. A reincidência é um conceito típico do sistema penal, extraído do art. 63 do CPB.
Art. 63. Verifica-se a reincidência, quando agente comete novo crime, depois de transito em julgado a sentença que, no país ou estrangeiro, o tenha condenado por crime anterior.
Ora, como se infere, este dispositivo é voltado para imputáveis, pois para adolescentes – menor de 18 anos de idade- a quem se atribui a pratica de atos infracionais incide o disposto no art. 122, II do ECA, que estabelece o seguinte, “in verbis”:
Art. 122. A medida de internação só poderá ser aplicada quando:
I - Trata-se de ato infracional cometido mediante grave ameaça ou violência a pessoa;
II - Por reiteração no cometimento de outras infrações graves. (grifo nosso);
III - Omissis.
Ora, como se observa, o ECA não fala em reincidência, mas em reiteração no cometimento de outras infrações graves. O representado, não obstante o atestado de santificação passado pelas testemunhas arroladas pela defesa, já responde a outros procedimentos infracionais – 0000000000000 (30.12.2008), 0000000000000 (10.01.2010), 0000000000000 (03.09.2010), já tendo sido apreendido quatro vezes, mostrando a sua inescondível inclinação para pratica de atos infracionais de natureza patrimonial e total desprezo às regras de convivência social. No dia 03 de setembro do corrente ano o representado Tício Santos foi apreendido na cidade “J” sob a acusação de ter perpetrado ato infracional similar a roubo. Desta forma, o que se observa, é que o representado não tem limites e vem reiterando consideravelmente na pratica de atos infracionais graves, de sorte a merecer uma reprimenda que seja capaz de afastá-lo temporariamente do convívio social e fazê-lo refletir sobre as conseqüências do ato praticado, e assim tentar reverter os fatores criminógenos que carrega consigo.
Na verdade, o ilustre defensor, na tentativa de procurar defender bem seu cliente, tenta minimizar a sua participação no ato infracional, afirmando que sua participação foi diminuta e requer a diminuição de pena de 1 a 2/3. Impõe-se mais uma vez esclarecer: o adolescente não cumpre pena. Ele é inimputável e está sujeito a sofrer medidas socioeducativas, que por ser diferente da pena, não tem qualificadoras e nem prazo determinado. Voltando ao ato infracional atribuído ao representado Tício Santos, vê-se que a colaboração dele no fato foi decisiva para o sucesso da empreitada delituosa. Na verdade, o representado Tício Santos, no âmbito da conhecida teoria do domínio funcional do fato, colaborou de forma eficaz na empreitada infracional, realizando a sua tarefa – pilotar a moto -, enquanto o outro comparsa, apontava a arma para a vitima. Jamais foi participar, mas co-autor, colaborando decisivamente para a realização do todo. O insigne penalista, Nilo Batista em sua obra “Concurso de Agentes” p. 101/102 explica categoricamente:

isso significa que só pode interessar como co-autor quem detenha o domínio (funcional) do fato; desprovida deste atributo, a figura cooperativa poderá situar-se na esfera da participação (instigação ou cumplicidade). O domínio funcional do fato não se subordina à execução pessoal da conduta típica ou de fragmento desta, nem deve ser pesquisado ma linha de uma divisão aritmética de um domínio integral do fato, do qual tocaria a cada co-autor certa fração. Considerando-se o fato concreto, tal como se desenrola, o co-autor tem reais interferências sobre o seu Se e o seu Como; apenas, face à operacional fixação de papéis, não é o único a tê-las, a finalisticamente conduzir o sucesso. Pode-se entretanto afirmar com o Roxin que cada co-autor tem sorte do fato total em suas mãos ( jeder das Schicksal der Gesamttat in der Hand Hat), através de sua função específica na execução do sucesso total, porque se recusasse sua própria colaboração faria fracasso o fato.”
Desta forma, torna-se despiciendo indagar se foi o representado Tício Santos ou o seu comparsa quem utilizou a arma. Se a arma realmente foi utilizada por terceira pessoa como consta dos autos, o representado Tício Santos, na divisão de tarefas, executou muito bem sua função, pilotando a moto no primeiro momento para o outro comparsa apontar a arma e render a vitima, para no segundo momento, pegar a moto roubada e fugir do local, caracterizando, sem dúvida alguma, a co-autoria no ato infracional similar ao tipificado no art. 157, § 2º, I e II do CPB.
Não há margem para a aplicação do instituto da remissão pura ou clausulada “in casu”, pois o ato infracional praticado pelo representado Tício Santos foi muito Grave, já que fora cometido mediante grave ameaça à pessoa, com emprego de arma de fogo e também as demais provas e circunstâncias apuradas revelam à sua reiteração no cometimento de outras infrações graves. A remissão, a teor do que dispõe o art. 126 e 127, só pode ser clausuladas com medidas socioeducativa em meio aberto, sendo vedado à sua cumulação com a semiliberdade ou internação.
Desta forma e do que consta dos autos, vê-se que o representado Tício Santos em co-autoria com terceira pessoa, cometeu ato infracional mediante grave ameaça à pessoa e de forma reiterada, amoldando-se a sua conduta ao disposto no art. 122, I e II do ECA. Com efeito, já foi apreendido 4 vezes e responde a outros procedimentos infracionais, não possuindo perfil adequado para sofrer uma medida socioeducativa mais branda. Na verdade, o representado Tício Santos representa sério risco para a paz social, pois não tem limites na sua sanha criminosa de subtrair coisas de outrem, podendo inclusive matar, se for necessário.
Posto isso, julgo procedente a REPRESENTAÇÃO para condenar o representado TÍCIO SANTOS, devidamente qualificado nos autos, a cumprir Medida Socioeducativa não superior a 3 anos no CASE em Salvador, pela prática de ato similar ao tipificado no art. 157, § 2º, I e II do CPB, amoldando-se a sua conduta no art. 122, I e II do ECA. Oficie-se ao CASE para os devidos fins.
Transitada em Julgado, arquivem-se os autos, ressalvada a necessidade de prosseguimento do efeito com relação ao outro representado.
P.R.I.
Itabuna-BA, 12 de dezembro de 2010.


DR. MARCOS ANTÔNIO SANTOS BANDEIRA
JUIZ TITULAR DA VIJ DE ITABUNA


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